sexta-feira, 17 de setembro de 2010

A sala de espera

Estar numa sala palida de inexpressividade, verde de desespero, silenciosa de impaciencia. Esperar um ponto na oração que acabamos. Ver os pés invadidos pelas trevas da velhice, caminhos sinuosos da experiencia, da invalidez na forma de estar. De pele áspera e disforme a empacotar a emboscada de uma vida. Aforquilhar as pontas dos dedos em dor. Soltar infrutuosamente a prisão das artérias. Revermos em analepse o corpo caducado em momentos de liberdade de movimentos, de luminosidade. Que desespero de silencio. Esperarmos pelo ultimo autocarro não sabendo o seu horário, anteciparmos expectantes a sua chegada: ouvirmos o som baluarte do motor já ali, ao virar da esquina; sentirmos o cheiro do seu escape, mas sem o ver. As vozes pelos corredores da gente nova que nos serve, a ferramenta desinteressada do seu objectivo, os ecos de um mundo paralelo, distante. A lembrança na imaculada parede, da infância despreocupada e colorida passada, um retrato de uma menina de chapéu em paisagem bucólica, com flores de vermelho vivo e caule verde lilás. Esta sala branca, inexpressiva, que espera infinita. No tecto a tinta estala, e por cada racha contamos os episódios de outras vidas que fizeram o mesmo. Que interrogações se cruzam no ar desta sala velha de pacientes, Que impaciência a espera da morte. Que abnegações a uma fé religiosa se fizeram nos seus meandros. Que fés se nutriram no desespero de causa da pergunta humana. A quantas causas nos dedicaríamos, fosse a oportunidade disponibilizada (uma vez mais), quantas vezes poríamos em causa episódios amorosos. Quantas vezes seriamos capazes de não nos arrependermos do que vivemos. E que bom objectivo de vida para ter, nestes passos finais. E que paciência pode um desesperado ter? Não quero o fim, mas um inicio. Já sei o que me espera.